quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

QUINTO TRECHO - CORRIENTES - JOAQUIM V. (V?) GONZALES





Seis de janeiro de 2011. Argentina total.
Quinto trecho. Média distância. 600 km. De Corrientes a Joaquim V. (V.?) Gonzales. A famosa travessia do Chaco. O tamanho do calor pode ser verificado pelo nome de duas das cidades pelas quais passamos: Infierno Del Chaco e Rio Muerto. Também tinha Cerro Queimado. Tudo nome de cidade de faroeste, empoeirada e calorenta. E eram mesmo. Para quem não acredita nos nomes, a Ju vai postar uma foto.
A idéia, por causa do calor previsto, era de sairmos de madrugada. Só que o café da manhã do hotel Guarany em Corrientes começava às 6:30hs. Nada de café mais cedo. O grupo optou por tomar o café e rezar um pouco para que o calor não pegasse.
Saímos às 6:50hs. Logo na saída, uma perdidinha. É que estávamos em dúvida se podíamos trafegar pela pista central da avenida que leva à Ruta 16 – a estrada que corta o Chaco. Um amigo do Otávio disse que foi parado pela polícia por trafegar pela faixa central e não pela lateral.
Pois bem, fomos pela lateral, por via das dúvidas, mas na hora de sair para a ponte – a que corta o Rio Paraná, em direção a Resistência (30 km de Corrientes – também é opção de dormir; pior, mas é) – o Otávio virou para um lado e eu e o Zé para o outro. Depois de uma volta mais comprida do que eu esperava, acabei por ver o Otávio entrando na ponte, encontramo-nos e não nos perdemos mais.
Do lado de lá, perto de Resistência, de súbito, o Otávio saiu da pista e foi para a marginal. Ali havia uma placa proibindo circulação de motos. Eles chamam essa marginalzinha de “Coletora”. Andam motos e bicicletas.
Era na tal da coletora que aconteceu do amigo do Otávio ser parado e quase linchado pelos policiais. Encontramos duas dessas. Uma ao lado de Resistência e outra em Presidência Roque Saenz Peña – um lugar que muita gente para nesse caminho. Uma cidade de uns oitenta mil habitantes. Antes não tinha hotel decente por lá. Agora parece que tem um novo, com muitos quartos. O nome, não sei. Assim que descobrir, eu posto.
Essas “coletoras” se explicam pelo tipo de trânsito de motos que há no local. São umas motos pequenas, velhas, muitos ciclomotores, apinhados de gente sem “casco” (o capacete deles). Vi diversas com menores, com três, com pai, mãe e dois filhos. Até nenê de colo eu vi. Esse pessoal realmente não podia trafegar na rodovia porque dava caca. Agora, as nossas grandes maxitrails são para rodar na estrada. E não podem. Consequentemente, temos que nos submeter às tais “coletoras”, senão eles param e multam. Multam, não, pedem “una contribuicion” – que não não estou disposto a dar.
Essa é uma dica importante. Quem vier pela Ruta 16, depois de Corrientes, tome cuidado com os trechos de pista com relação aos quais o tráfego de moto é proibido. Vão para as coletoras e voltem mais à frente.
Bom. A primeira parada foi Presidência Roque Saenz Peña. Cento e oitenta e dois km tocados. Chegamos lá às 9:10hs. 28º Celsius. Boa temperatura. Abastecer, uma aguinha, um Redbull para dar uma força para a atenção e estrada.
A segunda parada foi em Pampa de Los Guanacos. Trezentos e trinta e três km tocados. 11:10hs. Quando deu trezentos km a temperatura estava exatos 30° Celsius. Coincidência.
Ah! Sobre a temperatura, a mais alta que pegamos foi 31º Celsius. Absolutamente confortável. Quase o tempo todo estava 28° E o céu estava encoberto. Em outras palavras, justamente no lugar em que o calor era mais temido – o Chaco Argentino – pegamos a temperatura mais amena da viagem, porque havia chovido ontem em quase toda região. Sorte. Ou muita reza. Murmurar um “Salve Rainha” de vez em quando ajuda!
No posto em Pampa de Los Guanacos, uma coisa curiosa: a moto ficou coberta de abelhas. Movimentei-a, mas elas me acompanharam e ficaram. O jeito foi não mexer com elas e deixá-las rondando.
Só que depois, na estrada, uma delas – que deve ter pegado uma “carona” – foi jogada pelo vento no meu pescoço e me picou. Uma bela ferroada que me incomodou o tempo todo.
Sobre bichos em geral, o Chaco está cheio deles. O tempo todo bandos de passarinho levantavam voo à nossa passagem. Metia a mão na buzina para espantá-los. Deu certo, porque não pegamos nenhum. Também havia na “Ruta” muitas Marias Fedidas. Estouravam o tempo todo em nossos capacetes e vinha aquele cheiro característico.
Muito gado solto ao lado da pista. Bois, carneiros, cabritos, jumentos etc. E carcarás – aqui chamados de caranchos. Demos sorte de não pegarmos nenhum – à exceção da minha abelha no pescoço e de outro inseto não identificado que picou o braço da Ju e fez um caroço. Viemos disputando sobre em quem doía mais.
Além do gado, a paisagem ao redor estava coberta de girassóis. Já secos, prontos para a colheita. Por aqui seguramente o girassol é a cultura campeã.
Por conta dos girassóis, há muitas maquinas agrícolas na pista. Máquinas enormes, que chegam a invadir a pista contrária. Mas o movimento de veículos não é muito grande – apesar de ser maior do que o da Patagônia.
O posto da segunda parada – o de Pampa de Los Guanacos – tinha instalações sanitárias de dar inveja a qualquer boteco de beira de estrada da Amazônia. Ganhou a nota máxima de imundície: classificação três cocôs. Até os mosquitos se recusavam a entrar no banheiro. Mas a gente teve que fazer uso deles...
A terceira parada foi no km 491 às 13:00hs. Não anotei o nome da cidade. De curioso no local, havia dois ônibus cor-de-rosa de um grupo de suecos que estão viajando pela América do Sul. Eles devem aparecer no Rio de Janeiro – provavelmente no carnaval. E não será coincidência.
A temperatura estava extremamente amena para o Chaco nesta época: 27°Celsius. E pensar que há uns quinze dias atrás a temperatura média por aqui (média!) era de 40°! Escapamos do Infierno Del Chaco!
No posto chegou um grupo de São Paulo. Estavam em seis motos – diversas BMW e uma Suzuki com uma mulher de certa idade – e vinham do Atacama. Disseram que o trecho seguinte da estrada estava bem ondulado e com buracos. Aliás, os cinqüenta km anteriores estavam assim. É preciso tomar cuidado, porque a gente acostuma com aquele asfalto perfeito e de repente começa a pegar uns buracos que podem fazer um estrago.
Bom, na hora de abastecer, aquela muvuca de grupo muito grande e a mulher acabou por cair. Estragou o pisca da Suzuki dela. É por isso que grupo de mais de quatro motos começa a complicar. E pensar que em setembro vamos para a Route 66 em onze ou doze motos...
O quarto trecho teve alguns incidentes.
Logo na saída do posto, reparei que a top-case do Otávio estava com as chaves penduradas. Imaginem o transtorno de se perder as chaves do bagageiro. Simplesmente não dá para tirá-los da moto. Emparelhei para avisá-lo, diminuímos a velocidade, e aí um paraguaio que estava bem atrás grudou na traseira da minha moto. Cheguei a achar que tinha dado uma fechada nele, mas não foi isso que aconteceu. Ele só achou que não tinha que diminuir. Quando percebi, voltei para a pista da direita e tive que ver a mulher do paraguaio esbravejando e fazendo gestos pouco relevantes com a mão. Podia ter dado um acidente. Assim, a atenção máxima é sempre necessária, principalmente nessas retas enormes da Argentina. Como a tocada é razoavelmente tranqüila, há perigo de acontecer alguma distração que – bate três vezes na madeira – pode ser fatal.
A pista também estava muito deformada e tinha mais buracos do que o trecho anterior. Foi quase um tobogã. O Otávio chegou a perder uma água por conta do sobe-e-desce.
Pouco antes do final do destino, a maior confinação de gado que já vi na minha vida. Dos dois lados da pista, milhares e milhares de bois daqueles vermelhos de cara branca (Brangus? Red Angus? Qualquer outro Angus? Só sei que é bom!) que fazem a carne da Argentina ser tão deliciosa.
Tudo correu bem e chegamos em Joaquim V. (V.?) Gonzáles. Exatos seiscentos km de viagem. Horário de chegada: 14:50h. Temperatura: 27,5° Celsius (É, a reza ajudou! Obrigado Senhor!). No posto encontramos Daniel (se eu não me engano, este é o nome dele), um Argentino da Província de Santa Cruz, de uma cidade entre Caleta Olívia e Rio Gallego – ou seja, lá de baixo – que está viajando sozinho e vai para Machu-Pichu. Tiramos uma foto juntos. Também encontramos um trio muito simpático: avó, mãe e filha de Botucatu que faziam sozinhas, de carro, a expedição das três gerações. Admirável! Elas também vão para o Atacama e devemos nos encontrar pelo caminho.
Ficamos no Hotel Colonial: o melhor da cidade. Aceitável e caro para o nível (duzentos pesos). Mas pelo menos tem água quente (que hoje precisamos!) e ar condicionado.
Na cidadezinha, o mesmo esquema de todas na Argentina. À tarde, todos se recolhem. À noite é uma festa só! Todo o povo nas ruas e, principalmente, na praça.
Havia uma festa de Reis, com os três Reis Magos (um estava com cara de bebaço) desfilando em carro aberto. A criançada, apinhada em frente à Prefeitura local, vibrava. A Ju fotografou.
Comemos no único restaurante que encontramos. Toalhas lamentavelmente sujas. Cheio de bichos empalhados. Uma aparência de mapa do inferno ao contrário. Só que vieram uns bifes e umas fritas excelentes. E a cerveja estava trincando. Não tenho medo de afirmar que foi a melhor comida que comi em um lugar tão boca-de-porco, tão sujinho (mas não o Sujinho Chic de São Paulo) como aquele.
Por fim, os veículos. Um caso à parte.
As motos é aquela festa. Trafegam com três, quatro ou mais pessoas. Os carros, caindo aos pedaços com crianças na frente, o rosto grudado no vidro. Sem a menor noção de segurança básica.
O vencedor foi um Peugeot 405 que provavelmente tinha capotado e o dono, simplesmente, cortou o teto fora e fez um conversível! Esses carros transitam pelas ruas da cidade e passam em frente aos policias que os ignoram. É a Lei local, que vale só para os locais, de permissividade ao máximo. Mas é bem interessante.
Prossegue no próximo post. Fotos com a Ju, assim que eu parar de usar o computador. Abreijos. Toni.

Um comentário:

  1. Toni, o top-case do Otávio...ficou esquisito isso!!! kkkkkkk
    E me diga o que é mulher de certa idade? Aguardo resposta.
    O seu Salve rainha e as demais rezas são fortes, considerando que você não teve apoio.
    Amei o que escreveu. Eu me senti viajando. E bem que podia ser com as três de Botucatu, ou seja, de carro, pois não sei se tenho top-case suficiente para viajar de moto. Lendo tudo isso me lembrei da aventura que foi uma viagem de família, saindo de Bauru indo para Bonito. A estrada tinha todos os bichos possíveis, e o único lugar para comer era cinco cocôs. O banheiro era o matinho.
    Carancho (ou abutres para nós) também é um filme argentino, com Ricardo Darin.
    E o que me diz do tamanho de vocês dois, comparado a esses dois na foto??? Beijos para todos. E no futuro, isso tudo deverá ser um livro.

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